MariJoana e as Lembranças da
Variada
e
Quase Auto-Suficente Actividade da
Casa
Agrícola dos Meus Avós Maternos
MariJoana
descia de madrugada do sobrado onde criou o seu lúgubre e misterioso refúgio.
Acordava a restante criadagem para mais um dia de labuta que incluía o reavivar
das chamas do fogão a lenha, os despejos das cinzas e outros lixos, a recolha
de brasas para colocar nos ferros de engomar e nas braseiras, a ida à capoeira
para tratar da criação, a recolha na horta de alguma hortaliça e de fruta no
pomar.
Vivi
ainda dentro duma economia agrícola quase auto-suficiente com hortas, pomares,
capoeira, pocilgas, curral de ovinos, estábulo de animais de tiro e cela,
adega, lagar de azeite, destilaria de aguardente de figos, eira para debulha de
cereais e forno de cozer pão. A estrutura produtiva agrícola mantinha-se quase
intacta havia gerações. Só o velho moinho de vento, no cabeço sobranceiro ao
cemitério tinha desaparecido enquanto elemento activo duma intrincada e bem
urdida cadeia de produção. Só lhe restavam as paredes em ruína que eu escalava
em tardes solitárias, para contemplar, lentos, suaves e envolventes Pôr-do-Sol
por detrás da Serra d’Aire.
Todo
esse mundo ordenado entre senhores da terra e servos seus servidores, tão
parecido com o que reinou durante séculos por toda a Europa agrária, ainda
permanecia quase intacto, conservado por um estilo de governação e por uma
ideologia que preferia a continuidade à mudança.
Estávamos
na fronteira entre o minifúndio do Norte e o latifúndio do Sul. Vi chegar o 1º
tractor. Antes dele, e também antes de eu vir ao mundo chegara o vetusto
locomóvel a vapor que accionava por correias a debulhadora de cereais e
chegaram também os primeiros automóveis que iam convivendo com os veículos de
tracção animal. A propósito destes, lembro aquelas tardes de Domingo em que
saíamos de “breque” puxado por uma parelha de mulas e o cocheiro nos levava por
tortuosa estrada de “maquedame” até à aldeia da minha bisavó materna (Argea).
(escrito por Manuel Maria Azevedo Mendes Mourão em Março de 1996).
P.S. MariJoana desde que foi ama de leite de minha Mãe e de meus tios adptou a casa dos meus avós até falecer em 1963.
Publico a seguir foto dela tirada em 1954
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