domingo, 26 de fevereiro de 2023
Licor de tangerina
6. Licor de Tangerina
Bebi lentamente o último cálice do conteúdo que restava na garrafa e fiquei olhando e relembrando através daquele rótulo manuscrito pela caligrafia certa e determinada da minha Avó.
São tempos que se perdem nas recordações de infância, mas que tento relembrar nestas linhas.
Aquele licor era possível porque congregava uma série de recursos e tarefas que vou tentar resumir:
-a vinha e a vindima com as dornas das uvas lentamente transportadas por carros de bois;
- o trabalho da adega com o desengaçador accionado manualmente, a pisa, a tulha do mosto fervente e a prensa de parafuso;
- o alambique e a destilação do bagaço para a obtenção da aguardente ;
- o pomar onde nos fins de tarde de estio se regavam os pés dos citrinos com a água dos poços puxada pelos alcatruzes das noras.
Depois vinha o Inverno e com ele a maturação das tangerinas. Algumas das cascas eram aproveitadas e cuidadosamente raspadas pelo interior. Por fim era a infusão destas na aguardente em grandes frascos de vidro. Tal infusão durava meses até o licor ganhar o seu sabor e côr característicos.
Assim se produzia uma bebida toda feita de recursos caseiros (excepto o açúcar). Não provinha de nenhuma destilaria industrial, não tinha uma marca imposta publicitàriamente, nem a sua confecção fora decidida para conquistar determinada quota de mercado. Por isso brindo em memória da minha Avó e de todos aqueles que participaram na longa cadeia da confecção deste licor.
(Resumo de texto publicado no Jornal “Cidade de Tomar” em 25 de Maio de 1979)
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