domingo, 28 de janeiro de 2018

Carlos Azevedo Mendes e os Congressos das Misericórdias (4)



A realização do IV Congresso em simultâneo com as comemorações do V Centenário do nascimento da Rainha Dona Leonor foi mais uma manifestação “folclórica” ao gosto do Estado Novo com cerimónia de abertura nos Jerónimos presidida pelo Cardeal Cerejeira e sessão inaugural no salão das lotarias da Misericórdia de Lisboa aí presidida pelo chefe de Estado, Almirante Américo Tomás.  O feição reivindicativa e de procura de sã autonomia tinha desaparecido na onda avassaladora de controle e centralização do Estado Novo. As Misericórdias tinham ficado reféns dos esquemas de subsidiação do Estado, situação contra a qual tinha lutado desde o primeiro congresso Carlos Azevedo Mendes e que na altura contava com o apoio do Dr. Salazar que nos finais da 1ª República, e ainda sem responsabilidades governativas, tinha defendido publicamente essa autonomia e justa compensação financeira das Misericórdias.
 Não quero contudo menosprezar a valia técnica, histórica e doutrinária dos trabalhos desenvolvidos no âmbito deste IV Congresso onde intervieram figuras como o Dr. Marcello Caetano, o Director da Faculdade de Medicina de Lisboa, o Bastonário da Ordem dos Médicos, o Dr. Miller Guerra. O Dr. Azeredo Perdigão e o Director da Faculdade de Direito de Coimbra.
A análise destes conteúdos ultrapassa o âmbito deste artigo mas pode ser feita através da leitura das Actas do IV Congresso das Misericórdias publicadas em três volumes em 1959.
Correndo o risco de ser inconveniente eu diria que este Congresso não passou de uma laboriosa encenação na tentativa de manutenção do status quo do Estado Novo, cada vez mais contestado interna e internacionalmente.
Correndo também o risco de tentar interpretar estados de alma, a postura de Carlos Azevedo Mendes na sessão de abertura deste congresso (captada num instante fotográfico que se publica em anexo) parece reveladora dum desânimo de quem sente os ideais de autonomia e justiça para as Misericórdias postergados.
Carlos Azevedo Mendes teve direito a usar da palavra na sessão de encerramento presidida pelo Ministro da Saúde e Assistência da altura, Dr. Henrique Martins de Carvalho. Fê-lo como decano dos Provedores e em nome da todas as Misericórdias (13), mas o tempo de ser figura activa e actuante das Misericórdias já tinha passado, acrescento eu.

 (13) Actas do IV Congresso das Misericórdias, 1959, Vol. III, pgs. 158 e segs.

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