quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

Carlos Azevedo Mendes e os Congressos das Misericórdias (1)

Carlos Azevedo Mendes e os Congressos das Misericórdias (este texto tem como fonte principal e recorrente o livro da autoria do seu sobrinho Dr. Carlos Augusto Azevedo Mendes Dinis da Fonseca  e  intitulado “História e Actualidade das Misericórdias”)

A dedicação de Carlos Azevedo Mendes à causa das Misericórdias não se confinou a Torres Novas. Desde que surgiu a ideia (em 1922) da realização do 1ª Congresso nacional destas instituições que ele se envolveu na sua preparação e na defesa da tese da autonomia das misericórdias contra a criação dum imposto em benefício das mesmas.  Segundo ele, esta segunda opção iria colocar as misericórdias na dependência dos governos e da política.  O que para ele seria necessário era reparar as injustiças causadas às misericórdias pelas leis de desamortização de 1861 e 1866. Sobre este assunto, Carlos Azevedo Mendes trocou correspondência com Salazar em Outubro de 1923 quando este tinha acabado de terminar o seu mandato como Provedor da Misericórdia de Coimbra (1).
Parece que nessa altura os dois comungavam da mesma opinião e contavam com o apoio parlamentar de Joaquim Dinis da Fonseca(2). Este, tinha apresentado na Câmara dos Deputados um projecto de decreto que não chegou a ser apreciado e que daria às Misericórdias a possibilidade de não desamortizarem imediatamente os seus bens de raiz e criaria um consolidado-ouro de 6% para actualizar os juros de 2,1% que era o que as Misericórdias estavam a receber pelos títulos das desamortizações que tinham sido obrigadas a fazer (3)
 Na defesa publica da sua tese, e pouco tempo antes da realização do 1º Congresso, Carlos Azevedo Mendes concedeu uma entrevista ao jornal Novidades no dia 24 de Janeiro de 1924 onde falou da Caridade como fonte inesgotável das receitas das Santas Casas ; na sua confiança na generosidade dos Torrejanos que tinham doado ao longo dos tempos à Misericórdia local um património avultado, e no golpe fatal que a desamortização imposta pelo Estado liberal tinha vibrado neste património e na estabilidade financeira de todas as misericórdias. Considerava portanto que era necessário reparar a injustiça cometida e que essa era a tese que o Congresso devia defender.
Não restam dúvidas de que foi a angustiante situação financeira em que viviam as misericórdias na sua generalidade o principal móbil para a realização deste primeiro congresso que teve lugar em Lisboa entre 16 e 18 de Março de 1924 com a presença de 261 congressistas.
Nele se debateram duas teses principais: uma que reclamava justiça e independência em relação ao Estado e outra que aceitava viver à sombra do mesmo Estado e dos proveitos das contribuições. Os defensores desta segunda tese também aceitavam os princípios de justiça e autonomia defendidos pela primeira, mas parece que não confiavam que fossem suficientes para superar a aflitiva situação financeira.
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Embora uma análise detalhada deste congresso esteja fora do âmbito deste artigo, poderemos acrescentar que ele teve efeitos práticos com a publicação de legislação que criou um adicional de 5% que seria entregue às Comissões Municipais de Assistência e que o distribuiriam pelas Misericórdias dos respectivos concelhos. Conforme temiam os defensores da primeira tese, o intervencionismo estatal na vida funcional das Misericórdias tornou-se excessivo e as mesmas continuaram a viver com imensas dificuldades financeiras (4).
Face à situação criada logo se pensou na realização doutro congresso, o que aliás vinha na sequência do que se falara no encerramento do primeiro (5).
Este segundo Congresso realizou-se entre os dias 19 e 22 de Maio de 1929 na sede da Misericórdia do Porto com a presença de 294 congressistas (6), mais 33 do que no congresso anterior.
Também neste congresso Carlos Azevedo Mendes tem uma participação activa sempre na defesa da autonomia das Santas Casas e reclamando para as suas assembleias gerais a aprovação das contas que não deveria competir às entidades estatais (7).
O Dr. Joaquim Dinis da Fonseca leu as Conclusões do Congresso onde se destacam:
- o pedido de actualização dos juros dos títulos do Estado que as misericórdias tinham sido obrigadas a adquirir pelas leis liberais da desamortização;
- a reafirmação do caracter privado das Misericórdias mas que não impede que o Estado as deva ajudar financeiramente
- a reclamação da aprovação das contas para as Assembleias Gerais das Misericórdias e o envio em seguida das mesmas à Direcção Geral de Assistência.

1     (1)    Mais tarde, num discurso proferido no IV Congresso, Carlos Azevedo Mendes referir-se-há a esta troca de correspondência. Ver Actas do IV Congresso das Misericórdias, 1959, vol. III,  pg.162
1.  Quanto à carta de resposta de Salazar (doc. Inédito) ver o Anexo quinto do livro já citado “História e Actualidade das Misericórdias” que transcreve este documento.
       (2)    Figura politica muito próxima de Carlos Azevedo Mendes desde o tempo de estudantes em Coimbra e militantes do C.A.D.C.
      (3) Diário do Governo, II Série, 20 de Março de 1922

(4) Ver “História e Actualidade das Misericórdias” pg. 169.
(5) Idem , pg.  170
(6) Segundo Congresso das Misericórdias, 1930, pg.5
(7) Idem, pg. 167



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